A Viúva Negra
Posted by Vicente de Oliveira Luiz | Posted in | Posted on 15:49
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Capítulo I
Rosa pertence a uma linhagem de mulheres lindas, com nomes de flores e terríveis sinas com os homens. Ela não acreditava sequer que sua vida pudesse ser diferente, embora fosse muito jovem, já experimentara grande amargura. Sobre o pai, ela pouco sabia e de nada se lembrava. Com o primeiro namorado, teve certeza de sua má sorte. Depois que a engravidou, ele disse que era casado e foi embora.
Desde então, Rosa viveu discretamente, dedicando-se exclusivamente à filha. Acreditava que a reclusão abrandaria sua estrela nefasta e impediria que outros desapontamentos a acometessem.
Ainda assim, Rosa tornou-se objeto de cobiça dos homens, inveja das mulheres e comentário de todos. Sua presença era um tributo à beleza da flor que a nomeava, assim como foi com sua mãe, Hortênsia; sua avó, Violeta, e seria com sua filha, Magnólia.
O comportamento reservado a envolvia em mistério e a tornava fascinante para um séquito de admiradores. Uns a assediavam sutilmente, outros nem tanto, mas todos queriam sua companhia e, quiçá, algo mais. Eles enviavam presentes e flores ou a convidavam para sair. E se deparavam com uma negativa categórica, mas cortês de Rosa. Em vez de fazer com que desistissem, suas recusas inflamavam os desejos deles, e as investidas cada vez mais intensas a obrigavam a ser ainda mais arredia. As poucas palavras trocadas com ela, a discrição com a qual ela recusava os presentes e convites, o sorriso acanhado ante as juras de amor, a elegância dos gestos. Tudo isso revigorava as paixões dos pretendentes.
Houve até quem arriscasse uns versos, elevando-a a condição de musa, porém a maioria, sem nenhuma intimidade com a lira, preferiu mesmo foi louvar seus atributos mais palpáveis em vez de sua inefável beleza.
Quando Eugênio de Melo Vaz, o Geninho, um galã de subúrbio, com fama de conquistador, soube da beleza de Rosa, duvidou. Para ele, os encantados por ela eram afeitos a barangas e afins, portanto, desqualificados para avaliar a beleza de uma mulher.
Geninho viu Rosa pela primeira vez, quando ela levava Magnólia para a escola. Nesta ocasião, ela se vestia de maneira simples, quase austera, num esforço consciente, mas em vão, para não ser notada. O corpo, confinado por um vestido modesto, pulsava sensualidade. Os cabelos ainda que estivessem presos pareciam querer se lançar ao vento. Os seios se projetavam desafiando o rigor do decote. O pouco que se via permitia a conclusão de que o que não se via era ainda mais belo. Rosa exalava sedução.
Agora, como os demais, Geninho se rendeu aos encantos de Rosa e, para conquistá-la, teria que se desdobrar, e isso constituía uma novidade na vida dele.
Quando garoto ele até quis ser jogador de futebol, sonhava com fama e riqueza, mas nem esta nem aquela seriam possíveis com o trato dele com a bola. Também em ser policial, a farda e o exercício da autoridade com impunidade o fascinavam, mas faltava a ele a disciplina para os rigores da vida na caserna.
De família tradicional, sem posses há gerações, Geninho sentia profunda nostalgia pela fortuna que não havia desfrutado e se perdia em devaneios com as delícias de uma vida nababesca.
Alguém disse que o último reduto de um canalha é a política. No caso do Geninho, um pulha contumaz, foi o primeiro. Geninho viu na vida pública mais do que uma sinecura, ele vislumbrava a riqueza se avizinhar inexorável como uma sentença matemática. Ele queria recompensas sem percalços, com um cargo bem remunerado que exigisse pouco ou nenhum esforço, e se lançou na política pronto a tratar o erário com o decoro de uma meretriz embriagada.
Cedo ou tarde, ele acreditava que teria êxito, já que no princípio as coisas não pareceram muito promissoras. Sem conseguir uma indicação para um cargo eletivo, Geninho tornou-se assessor de um vereador falastrão e prevaricador, o Sandoval Pires. Algo um tanto quanto reles para um homem com suas ambições, mas que, com o passar do tempo, se revelou não ser de todo ruim. Ele começou ciceroneando correligionários do interior e de outros estados na vida noturna e organizando jantares e festinhas para simpatizantes e empresários. E acabou ganhando reputação nos bastidores do partido, limpando, com muita discrição, toda e qualquer sujeira que viesse a constranger alguém proeminente do partido que estivesse com a probidade ameaçada, o que não era raro. Tudo parecia feito na medida para ele. Do contrário, Geninho iria compartilhar suas aptidões em outra freguesia.
Alguém disse que o último reduto de um canalha é a política. No caso do Geninho, um pulha contumaz, foi o primeiro. Geninho viu na vida pública mais do que uma sinecura, ele vislumbrava a riqueza se avizinhar inexorável como uma sentença matemática. Ele queria recompensas sem percalços, com um cargo bem remunerado que exigisse pouco ou nenhum esforço, e se lançou na política pronto a tratar o erário com o decoro de uma meretriz embriagada.
Cedo ou tarde, ele acreditava que teria êxito, já que no princípio as coisas não pareceram muito promissoras. Sem conseguir uma indicação para um cargo eletivo, Geninho tornou-se assessor de um vereador falastrão e prevaricador, o Sandoval Pires. Algo um tanto quanto reles para um homem com suas ambições, mas que, com o passar do tempo, se revelou não ser de todo ruim. Ele começou ciceroneando correligionários do interior e de outros estados na vida noturna e organizando jantares e festinhas para simpatizantes e empresários. E acabou ganhando reputação nos bastidores do partido, limpando, com muita discrição, toda e qualquer sujeira que viesse a constranger alguém proeminente do partido que estivesse com a probidade ameaçada, o que não era raro. Tudo parecia feito na medida para ele. Do contrário, Geninho iria compartilhar suas aptidões em outra freguesia.
A despeito da ausência de caráter, Geninho causava boa impressão. Ele tinha boa aparência, era amigável como os bajuladores, loquaz como os mentirosos e envolvente como só os vaidosos costumam ser.
Ele enviou presentes, que Rosa recusou como havia feito com os demais, se ofereceu para acompanhá-la aonde quer que ela desejasse ir, mas ela não queria ir a lugar algum com ele ou outro qualquer. Então, Geninho se valeu de uma artimanha, respaldada por um ditado popular e deixada de lado pelos concorrentes, que consistia em bajular a filha para agradar à mãe. Os presentes e os convites passaram a ser para Magnólia que, ao contrário de Rosa, não recusava nada.
Uma das manias do Geninho era filmar e fotografar discretamente quem quer que fosse em situações vexatórias. Mas desta vez, sua intenção não era constranger, mas encantar. As fotos e vídeos de Magnólia foram o atalho para o coração de Rosa.
Geninho se fez presente de tal maneira na vida delas que nem mesmo os temores ancestrais de Rosa foram capazes de impedir que ela cedesse outra vez ao amor. E a leveza, que este sentimento traz, a tornou ainda mais bela.
Sem se dar conta de que não há trégua para uma estrela adversa, ela ousou ignorar sua desdita e sorriu para a vida. Porém, o destino aziago de Rosa hibernava reunindo forças para cobrar com rigor este momento de bem-aventurança.
Logo, eles estavam namorando, ficaram noivos e se casaram.
Na lua de mel, Rosa conheceu prazeres que nem sequer imaginava. Geninho era um amante experiente, certamente muito mais do que ela, cuja vida sexual se resumia, no máximo, a três ou quatro relações no banco de trás do carro do primeiro e único namorado até então.
Capítulo II
Embora fosse contra o casamento, a família de Geninho não se opôs. De fato, nem tentou. Todos consideravam um golpe do baú, e não um casamento com uma mãe solteira sem posses, como a sua única possibilidade de ascensão social. Como era sabido que Geninho não tolerava ser contrariado, fez-se o silêncio cúmplice das calamidades.
Antes de conhecer Rosa, ele estava à beira da acomodação, bastante satisfeito como assessor do vereador Sandoval. Agora, renovado pelas núpcias, Geninho estava pronto para feitos à altura da sua ambição.
O casamento fez bem a ambos, Rosa vivia em êxtase. Sem o peso que a oprimia antes, ela mudou a maneira de se vestir e de se comportar. Trocou os vestidos austeros e de cores sóbrias por roupas modernas e coloridas e cedeu aos encantos do riso e da companhia. Não que ela tenha se tornado amiga de festas, apenas abandonou a atitude arredia e avessa a contatos que era sua garantia até então contra os revezes da vida.
A presença de Rosa e Geninho fascinava a todos. Até o Sandoval Pires percebeu o efeito do carisma do casal e não dispensava a presença deles a seu lado. Ele os apresentava com entusiasmo, rasgando elogios à beleza de Rosa, que era inegável, e à competência de Geninho, que era questionável, a não ser que se tratasse de algo insidioso e condizente com a singularidade de seus talentos.
Um sábado de madrugada, Geninho se deu conta que as declarações do Pires tinham surtido efeito e ecoado até as altas esferas do partido. Ele recebeu uma ligação de uma mulher que falava em nome de Paulo César Frota, um jovem deputado, com futuro promissor e reputação até então intocada. O deputado estava em uma festinha particular, e seu acompanhante, devido aos excessos da noitada, passou mal e precisava de ajuda.
Geninho fez algumas perguntas, anotou o endereço, pegou uma mochila com seu equipamento e saiu sem acordar Rosa, para mais uma vez escamotear deslizes que pudessem macular carreiras sólidas ou mesmo ascendentes de notáveis do partido.
Ele foi até um flat de um condomínio de luxo em um bairro nobre, sendo recebido por uma mulher, a mesma que fizera a ligação. Geninho viu que não se tratava de uma garota de programa, mas da noiva do deputado e filha do presidente do partido, o ex-senador Juvenal Linhares.
Geninho se fez presente de tal maneira na vida delas que nem mesmo os temores ancestrais de Rosa foram capazes de impedir que ela cedesse outra vez ao amor. E a leveza, que este sentimento traz, a tornou ainda mais bela.
Sem se dar conta de que não há trégua para uma estrela adversa, ela ousou ignorar sua desdita e sorriu para a vida. Porém, o destino aziago de Rosa hibernava reunindo forças para cobrar com rigor este momento de bem-aventurança.
Logo, eles estavam namorando, ficaram noivos e se casaram.
Na lua de mel, Rosa conheceu prazeres que nem sequer imaginava. Geninho era um amante experiente, certamente muito mais do que ela, cuja vida sexual se resumia, no máximo, a três ou quatro relações no banco de trás do carro do primeiro e único namorado até então.
Capítulo II
Embora fosse contra o casamento, a família de Geninho não se opôs. De fato, nem tentou. Todos consideravam um golpe do baú, e não um casamento com uma mãe solteira sem posses, como a sua única possibilidade de ascensão social. Como era sabido que Geninho não tolerava ser contrariado, fez-se o silêncio cúmplice das calamidades.
Antes de conhecer Rosa, ele estava à beira da acomodação, bastante satisfeito como assessor do vereador Sandoval. Agora, renovado pelas núpcias, Geninho estava pronto para feitos à altura da sua ambição.
O casamento fez bem a ambos, Rosa vivia em êxtase. Sem o peso que a oprimia antes, ela mudou a maneira de se vestir e de se comportar. Trocou os vestidos austeros e de cores sóbrias por roupas modernas e coloridas e cedeu aos encantos do riso e da companhia. Não que ela tenha se tornado amiga de festas, apenas abandonou a atitude arredia e avessa a contatos que era sua garantia até então contra os revezes da vida.
A presença de Rosa e Geninho fascinava a todos. Até o Sandoval Pires percebeu o efeito do carisma do casal e não dispensava a presença deles a seu lado. Ele os apresentava com entusiasmo, rasgando elogios à beleza de Rosa, que era inegável, e à competência de Geninho, que era questionável, a não ser que se tratasse de algo insidioso e condizente com a singularidade de seus talentos.
Um sábado de madrugada, Geninho se deu conta que as declarações do Pires tinham surtido efeito e ecoado até as altas esferas do partido. Ele recebeu uma ligação de uma mulher que falava em nome de Paulo César Frota, um jovem deputado, com futuro promissor e reputação até então intocada. O deputado estava em uma festinha particular, e seu acompanhante, devido aos excessos da noitada, passou mal e precisava de ajuda.
Geninho fez algumas perguntas, anotou o endereço, pegou uma mochila com seu equipamento e saiu sem acordar Rosa, para mais uma vez escamotear deslizes que pudessem macular carreiras sólidas ou mesmo ascendentes de notáveis do partido.
Ele foi até um flat de um condomínio de luxo em um bairro nobre, sendo recebido por uma mulher, a mesma que fizera a ligação. Geninho viu que não se tratava de uma garota de programa, mas da noiva do deputado e filha do presidente do partido, o ex-senador Juvenal Linhares.
Ela estava tranquila, bem à vontade, apenas de calcinha, mas o Frota estava dando chilique, só de cueca. Ele andava de um lado para o outro, agitando os braços e se lamentando sobre o que seria da vida dele sem o amante.
Enquanto Geninho verificava o pulso e aferia a pressão do rapaz, a noiva do Frota sentou-se para assistir televisão, aparentando indiferença ao que se passava ao redor. Depois de ajeitar dois travesseiros sob a cabeça do garotão, ele ligou para alguém, que deveria ser um profissional de saúde, fez um relato e desligou.
Geninho tranquilizou o Frota dizendo que o pulso e a pressão do rapaz estavam normais e que logo ele estaria bem, bastava que repousasse um pouco. Aproveitou e sugeriu que deputado tomasse um calmante e descansasse também. Depois de tomar o sedativo, o deputado foi até a cama e ficou olhando o amante dormir, como uma adolescente velando o pôster de um galã na parede do quarto, até adormecer também.
Sem prestar atenção à televisão, os olhos de Geninho iam discretamente da cama onde dormiam o deputado e o namorodo, passando pela mesa com bebidas, estimulantes e papelotes de cocaína, até o sofá onde estava sentada a noiva do deputado. Ela era magra, alta e sensual.
Lânguida e insinuante, ela se levantou, foi até a cama e colocou uma manta sobre o noivo e o rapaz. Depois, serviu-se de uísque, cheirou uma carreira de cocaína e fez um gesto para que Geninho fizesse o mesmo. Estoicamente, ele declinou.
Geninho sentou-se em uma poltrona de forma que pudesse observar a cama onde o deputado e o rapaz dormiam, sem perder os movimentos dela. E só então se serviu do uísque que o envolveu em uma atmosfera de requinte e o lembrou que ele tinha que manter o controle, pois ainda estava longe do que almejava.
Sem prestar atenção à televisão, os olhos de Geninho iam discretamente da cama onde dormiam o deputado e o namorodo, passando pela mesa com bebidas, estimulantes e papelotes de cocaína, até o sofá onde estava sentada a noiva do deputado. Ela era magra, alta e sensual.
Lânguida e insinuante, ela se levantou, foi até a cama e colocou uma manta sobre o noivo e o rapaz. Depois, serviu-se de uísque, cheirou uma carreira de cocaína e fez um gesto para que Geninho fizesse o mesmo. Estoicamente, ele declinou.
Geninho sentou-se em uma poltrona de forma que pudesse observar a cama onde o deputado e o rapaz dormiam, sem perder os movimentos dela. E só então se serviu do uísque que o envolveu em uma atmosfera de requinte e o lembrou que ele tinha que manter o controle, pois ainda estava longe do que almejava.
Ali, dando os primeiros passos em um mundo em que ansiava pertencer, Geninho percebeu que havia amadurecido. Antes ele simplesmente partiria para cima da mulher, das drogas e da bebida, com o comedimento de um vira-lata esfomeado. No entanto, sob o efeito inebriante de um uísque que ele jamais degustara, se deu conta que aquela mulher não era qualquer uma. De família abastada e poderosa, ela era ainda mais importante que o noivo.
Ele precisava saber como agir com aquela mulher, que parecia alheia, mas estava atenta a tudo. Sentia os olhos dela, sutis e perspicazes, sobre ele.
Geninho queria transar com ela, mas, primeiro, tinha que ganhar sua confiança e, para isso, era preciso se ater ao que tinha vindo fazer.
Logo, os três eram vistos juntos em toda parte, Geninho substituiu o garotão no coração e na cama do deputado e da noiva, com a convicção de alguém a serviço de um bem maior e a lascívia de um proxeneta.
Às vezes, Rosa se juntava a eles em jantares e eventos e ficava deslumbrada com a sofisticação do casal e com a atenção que eles devotavam ao marido. O deputado, mais de uma vez, fez comentários auspiciosos sobre o futuro do Geninho. Rosa anuía embevecida e orgulhosa.
A presença constante dele ao lado dos noivos gerou comentários, mas a imagem arrebatadora de Rosa pairava acima de tudo impedindo que grassasse a maledicência.
Outro no seu lugar seria mais discreto, mas era a opinião de uns poucos e não da maioria que interessava para Geninho. Logo, ele mostraria isso de maneira contundente.
Um deputado da cúpula do partido, Hilário Braga, se interessou por Rosa e insinuou que dificultaria a indicação do Geninho ao cargo de vereador nas próximas eleições, caso não passasse alguns momentos com ela. Ousou até a comentar que não se importava em se valer de qualquer expediente, inclusive o uso de drogas, para ter Rosa.
Um pouco antes de amanhecer, ela adormeceu. Geninho a tomou nos braços e a levou até a cama onde o deputado e o rapaz dormiam. Então, ele vasculhou os cestos de lixo e a geladeira, pegou tudo que pudesse causar constrangimento, comprometer ou incriminar, colocou na mochila e saiu com a certeza de dever cumprido e, talvez, de mais uma conquista. Só que essa seria fundamental para o andamento de seus anseios arrivistas.
Na semana seguinte, os pensamentos de Geninho sondavam o porvir. Ele ficou distante e indiferente até receber um convite para jantar com o deputado. Ao chegar ao restaurante, Geninho viu que o deputado estava acompanhado pela noiva. O Frota agradeceu entusiasticamente e prometeu que ele seria muito bem recompensado. Geninho até tentou dizer que não precisava, que aquilo fazia parte do trabalho dele e que era tudo para o bem do partido, mas não disse, sabendo que não convenceria.Logo, os três eram vistos juntos em toda parte, Geninho substituiu o garotão no coração e na cama do deputado e da noiva, com a convicção de alguém a serviço de um bem maior e a lascívia de um proxeneta.
Às vezes, Rosa se juntava a eles em jantares e eventos e ficava deslumbrada com a sofisticação do casal e com a atenção que eles devotavam ao marido. O deputado, mais de uma vez, fez comentários auspiciosos sobre o futuro do Geninho. Rosa anuía embevecida e orgulhosa.
A presença constante dele ao lado dos noivos gerou comentários, mas a imagem arrebatadora de Rosa pairava acima de tudo impedindo que grassasse a maledicência.
Outro no seu lugar seria mais discreto, mas era a opinião de uns poucos e não da maioria que interessava para Geninho. Logo, ele mostraria isso de maneira contundente.
Um deputado da cúpula do partido, Hilário Braga, se interessou por Rosa e insinuou que dificultaria a indicação do Geninho ao cargo de vereador nas próximas eleições, caso não passasse alguns momentos com ela. Ousou até a comentar que não se importava em se valer de qualquer expediente, inclusive o uso de drogas, para ter Rosa.
Quando soube, Geninho pasmou até o mais abjeto de seus pares, riu da sugestão do deputado e disse que não precisaria lançar mão de quaisquer artifícios que entorpecessem os sentidos de Rosa para que o Braga lograsse seus desejos.
Em um de seus encontros com a noiva do Frota, Geninho a instruiu que contasse a Rosa sobre o interesse do deputado nela e de sua ameaça em suspender a indicação da candidatura do Geninho para as próximas eleições municipais e, sobretudo, que enfatizasse que isso arruinaria as esperanças dele no partido.
Depois disso, ele se fez taciturno e arredio. Quando Rosa ficou sabendo do interesse do Braga por ela e das implicações desse desejo, entendeu a atitude do marido e aceitou passar a noite com o deputado sem hesitar, como se fosse apenas mais uma obrigação trivial de dona de casa.
Em um de seus encontros com a noiva do Frota, Geninho a instruiu que contasse a Rosa sobre o interesse do deputado nela e de sua ameaça em suspender a indicação da candidatura do Geninho para as próximas eleições municipais e, sobretudo, que enfatizasse que isso arruinaria as esperanças dele no partido.
Depois disso, ele se fez taciturno e arredio. Quando Rosa ficou sabendo do interesse do Braga por ela e das implicações desse desejo, entendeu a atitude do marido e aceitou passar a noite com o deputado sem hesitar, como se fosse apenas mais uma obrigação trivial de dona de casa.
Geninho conseguiu o apoio do Braga, mas ainda teria que provar que seu caráter estava à altura da moralidade torpe de seus pares.
Capítulo III
Quando Magnólia completou quinze anos, Geninho fez da festa de debutante dela um acontecimento à altura do status recém-adquirido. Com pompa, Magnólia foi apresentada à sociedade que Geninho até então apenas tangenciara. Compareceram pessoas importantes do recente círculo social dele, mas a presença de Juvenal Linhares, o presidente do partido, apesar dos sinais evidentes de decrepitude física, o deixou lisonjeado.
Magnólia ficou felicíssima, quando dançou a valsa com um galã de TV sem talento, salvo o de encantar adolescentes. Geninho distribuiu abraços e sorrisos aos anônimos e notáveis presentes, claro que com estes o entusiasmo era maior do que com aqueles.
Algum tempo depois, em uma das festinhas com o deputado e a noiva, Geninho soube que o Linhares tinha ficado fascinado por Magnólia e, embora debilitado e sem vigor, queria estar com ela com privacidade.
O Frota garantiu que nada de ruim aconteceria a Magnólia, já que as condições físicas do sogro deixavam a desejar.
Depois de momentos de silêncio, quando o Frota já esperava um sonoro não, uma espinafrada homérica ou mesmo um soco na cara, Geninho surpreendeu dizendo que não pouparia esforços para proporcionar o que talvez fosse o último momento de prazer do Linhares.
Para gerar situações que permitissem a realização dos desejos do Linhares, Geninho revelou mais uma vez que era talhado para aleivosias, mancomunado com o deputado, eles forjaram uma plataforma da campanha eleitoral, sugerindo ações em defesa do meio ambiente para atrair a juventude.
Depois, organizou eventos nos quais precisava viajar com frequência e insistia muito para que Rosa e Magnólia o acompanhassem. Elas viajavam com ele quase sempre, até que uma vez Rosa sentiu-se indisposta e deixou de ir, mas permitiu que Magnólia fosse.
Desta vez, era uma manifestação pela limpeza das praias. Com cobertura da imprensa, vários adolescentes, com camisetas com dizeres em prol da preservação da vida marinha, recolhiam entusiasmados lixo de uma praia.
À noite, depois do jantar, aconteceu uma festinha de comemoração. Geninho alertou os jovens para que não consumissem bebidas alcoólicas, mas deixou bebida ao alcance deles, sabendo que não se furtariam em se embriagar, inclusive Magnólia.
Enquanto Magnólia dançava com as amigas, Juvenal Linhares, à espreita, antecipava momentos de prazer com ela.
Ao perceber que um garçom levava margueritas para Magnólia e amigas, Geninho o interceptou, pegou a bandeja e batizou as bebidas com boa noite, Cinderela . Ao notar que elas já estavam embriagadas, Geninho encerrou a festinha, deu uma pequena bronca em todos, num tom bem-humorado, por terem bebido e pediu que fossem dormir.
Ele mesmo conduziu Magnólia e as amigas aos quartos. Elas estavam tão entorpecidas que ele não teve dificuldade em deixar Magnólia no quarto do Linhares. Enquanto aguardava que o Linhares consumasse seus desejos com Magnólia, Geninho passou a noite na porta do quarto.
No dia seguinte, alheias e desorientadas, elas não se lembravam de quase nada da noite anterior. Geninho atribuiu o mal-estar delas à bebida.
Enfim, sua ambição incontida, aliada à índole duvidosa, encontrava sua seara. Ele estava se entrosando com as altas esferas e pronto para participar como convidado do banquete de abominações sem fim com os corruptos e lascivos.
A indisposição de Rosa era decorrente de uma gravidez e foi marcada por sobressaltos e pesadelos, mesmo assim ela não se descuidou de Magnólia, a pretexto de ir ao ginecologista, fez com que a filha também fosse examinada, mas não havia nada de errado fisicamente com a menina constatou o médico.
Mas isso não a tranquilizou. Seus temores voltaram avassaladores e ainda mais tétricos do que antes e só atenuaram quando o choro de Açucena ocupou a casa, mas o coração de Rosa permaneceu inquieto e sombrio.
Meses depois, em uma noite de chuva, Geninho foi vítima de uma tentativa de assassinato, quando voltava para casa. Alguém o alvejou com seis tiros quando ele acionava o controle remoto para abrir o portão da garagem. Geninho só foi encontrado na manhã seguinte, agonizando.
Ninguém escutou nada devido aos trovões, mas os vizinhos afirmaram ter visto um homem estranho rondando a casa naquele mesmo dia.
A polícia conseguiu um retrato falado do suspeito, um homem de meia-idade, estatura mediana, atarracado, cabelos grisalhos, barba por fazer, óculos ray-ban, boné preto, camisa xadrez, casaco militar, calça jeans e coturnos.
Ao lado do portão, atrás da cerca-viva, onde o assassino ficou de tocaia, havia pegadas que permitiram que a polícia fizesse uma estimativa de peso do suspeito, o ângulo dos tiros e a identificação do número dos coturnos que ele usava.
Dias depois, luvas e uma arma com a numeração raspada e silenciador foram encontradas a dois quarteirões da casa do Geninho. Exames de balística comprovaram que era a arma do crime.
Muitos sabiam que Geninho não valia grande coisa, mas o atentado causou comoção, ainda mais depois que se soube que ele nunca mais andaria e falaria novamente. E só sobreviveria à custa de aparelhos.
Acreditava-se que Geninho não tinha inimigos até que vídeos comprometedores vazaram na internet e foram divulgados à exaustão como de costume. Em poucas horas, os envolvidos saíram das colunas sociais para as páginas policiais. Logo, só se falava do cinismo nauseante do Braga e do Pires, contando vantagens numa roda de pôquer sobre fraudes em licitações e esquemas de lavagem de dinheiro, sem poupar detalhes escabrosos. Também foi assunto o chilique do deputado na noite em que Geninho o conheceu e, sobretudo, o Linhares bolinando uma menor, nua e drogada.
Geninho foi visto como um herói, acreditava-se que ele estava reunindo provas para denunciar a sordidez e corrupção de seus pares na vida pública.
As investigações revelaram as falcatruas e os golpes de sempre, mas só arranharam a credibilidade dos envolvidos. O Braga e o Pires alegaram inocência. O deputado Paulo César Frota recorreu a um expediente antigo dos bem-nascidos em desgraça e foi para o exterior com a noiva em busca de esquecimento. O Linhares se esquivava do processo por pedofilia, entrando e saindo de hospitais, alegando problemas de saúde decorrentes da idade avançada.
A despeito da grande repercussão e indignação que os vídeos provocaram, logo o caso foi esquecido.
Meses depois do nascimento de Açucena, Rosa executou um ritual que seria repetido nos próximos anos. Pela manhã, ela dispensou a enfermeira e a empregada e levou Magnólia até a casa de sua mãe, Hortênsia.
À noite, Rosa carregou até o quarto do casal uma mala, de onde retirou uma série de coisas que pôs meticulosamente em uma poltrona. Em seguida, colocou um vídeo para que Geninho assistisse. Normalmente era um filme de ação, mas desta vez era uma reportagem de TV sobre seu incidente, com declarações do delegado a respeito do andamento das investigações e apresentação do retrato falado do suspeito. Depois, imagens com o Braga e o Pires saindo de uma delegacia sem dar declarações. O Frota jantando em restaurante sofisticado no exterior com a noiva. Uma retrospectiva da carreira do Linhares com personalidades de destaque da política. E, finalmente, imagens do Linhares com Magnólia.
Enquanto isso, fora do alcance visual dele, Rosa se despiu e fez uso do que havia retirado da mala. Ela colocou enchimentos de espuma nas pernas, braços e tronco, vestiu uma calça jeans de homem, uma camisa xadrez, um casaco preto e calçou um coturno militar com o número bem maior do que o dela. Depois, se maquiou, transformando sua pele jovem em enrugada e macilenta. Aplicou um queixo falso com uma barba rala e arrematou com uma peruca grisalha, um boné preto e óculos ray-ban. Açucena, em pé no berço, observava a transformação de sua mãe.
Então, Rosa surgiu diante dele, Geninho quis correr e gritar, mas não podia. Ele estava à mercê do seu algoz. Saboreando seu desespero, Rosa ficou em pé diante dele até que a reconhecesse e compreendesse que ela sabia de tudo e que ninguém tocaria na filha dela impunemente. Depois, fez um gesto com a mão como se fosse um revólver, apontou o indicador para o Geninho e flexionou o polegar seis vezes, imitando com a boca o som surdo de tiros, sob o olhar divertido e os risos de Açucena.
Parabéns, Vicente!
Coisa de mestre!
Vé se publica em algum lugar e para de mexer... hahahahah
Abraços
Sensacional Viça. O final me surpreendeu!
A ruptura acontece de maneira gradual, sem barulho, o texto flui bem, mesmo com toda erudição e vocábulos complexos. Parabéns.